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O Pássaro que Anda


Tenho vivido tantas mudanças em minha vida ultimamente e acho que isso tem sido muito comum para cada um de nós. Mas, por mais que as mudanças estejam sendo rápidas, quando eu olho para trás, percebo que elas foram o fruto de algumas coisas que eu desejei e escolhi há algum tempo. Eu estava voltando do trabalho à noite um tanto cansada. Uma parte de mim se entristece ou até mesmo fica preocupada quando fico cansada, pensando que, talvez, eu possa estar muito distraída nesta rotina de trabalho.


Mas, naquele momento voltando para casa, me vi como uma ave. Tenho convivido muito com pássaros, que me trazem grande alegria e me convidam a estar comigo mesma. E me ver como um passarinho foi muito interessante para mim. Eu era um passarinho que andava.


Apesar de saber que eu tinha asas e já experienciei voar tantas vezes, eu estava experimentando o andar. Num momento, ao voar alto, eu contemplei o chão. Talvez porque eu sentisse que estava indo tão além, céu afora...


E havia, dentro de mim, um desejo para saber como era o chão, a terra, as plantas, os animais, para sentir de perto a natureza. E esse desejo se expandiu no ar, até que, um dia, eu pude, enfim, vivenciar essa minha escolha de andar. Morando em Ilhéus, escolhi trabalhar em um emprego convencional. Trabalho como assistente na empresa da minha irmã pela manhã e como professora de inglês à tarde e, algumas vezes, também à noite. É uma experiência nova trabalhar dessa forma, pois eu não trabalhei muito de uma maneira convencional nesta vida.


Eu já compreendo que é bem fácil se distrair com as rotinas diárias de trabalho e se envolver com as metas, objetivos, com as contas para pagar e as necessidades que "compramos" do mundo. É sedutor olhar mais para o lado de fora em vez de sentir dentro de si. O cansaço pode ser uma desculpa para permanecer na hipnose da "consciência de massa". É muito comum comprar a ideia de que é preciso trabalhar e se esforçar para conseguir o que quer, como se a única maneira de se conseguir “tudo” fosse trabalhando duro. É muito comum fazer hora extra, trabalhar ainda mais com o objetivo de conseguir comprar mais, para tentar pagar mais folgadamente as contas e ter condições de fazer uma viagem como recompensa do trabalho duro. É comum achar que está se sacrificando por alguém (pela família, por exemplo) para que tenha uma vida "melhor". Ah, bendito "poder" de compra!... Minhas asas sempre me lembram de que a vida não é apenas isso. Sei, por experiência própria, que tudo pode ser muito mais simples. Mas, em algum nível, eu escolhi estar aqui como um pássaro que anda.


Algumas vezes, minhas pernas se cansam. Andar não é muito comum para os pássaros. Não preciso caminhar, nem tampouco chegar a algum lugar. Posso apenas voar... E também posso andar e experimentar a terra mais de perto. Tudo são experiências. Libero a crença de “trabalhar para ter”. Por isso, quando eu me sinto cansada, logo me convido, convido tudo de mim para respirar com consciência. E, assim, fica mais leve e cheia de compaixão essa brincadeira de experimentar, neste momento, como é um pássaro que (também!) anda. (Aline Bitencourt)




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